miércoles, 15 de enero de 2014

O Senhor é astrônomo? Eu sou de Capricórnio!

Segundo o Evangelho de Mateus uns magos vieram do Oriente a Jerusalem e disseram: Onde está aquele que é nascido rei dos judeus? porque vimos a sua estrela no oriente, e viemos a adorá-lo. A tradição popular diz, entre tanto, que eram três Reis Magos: Melchior, Gaspar e Baltazar.   Do texto de Mateus depreendem-se três conclusões e um lema, a seguir: (1) que não (necessariamente) eram reis, (2) que seu número é indefinido,  (3) que há uma contradição porque vindo do Oriente uma estrela que está no Oriente não pode conduzi-los ao Ocidente, para Belém; e o Lema: que os Evangelhos são os livros mais vendidos e provavelmente os menos lidos.

Uma linha intepretativa diz que os  magos eram sábios do Oriente (a Biblia Sagrada da Sociedade Bíblica do Brasil os chama de homens que estudavam as estrelas, Mateus 2:1) e como naquela época não havia saber maior que a Astrologia, eram astrólogos vindos da Pérsia.   Achar um evento astronômico que corresponda com a estrela de Belém que guiou os magos do Oriente, foi de encontro com a inoportuna obstinação da evidência científica.   Nossa ignorância sobre a vida de Cristo, no entanto, aumenta as chances de  encontrar a Estrela Guia, já que segundo o evangelista Mateus, nasceu em tempos do tretarca  Herodes, falecido em 4 antes de Cristo.   Toda uma contradição morrer antes que aquele a quem iria sentenciar de morte!  Mas essa incerteza permite estender a busca no passado. 

Foi talvez Johannes Kepler, um dos maiores astrônomos da história, quem mais próximo esteve de encontrar um evento digno do nascimento do Filho  de Deus: a  muito pouco freqüênte conjunção de Júpiter com Saturno na constelação de Peixes,  constelação símbolo da cristandade, no ano de 7 AC (voltaram a se encontrar no ano seguinte também). Embora a conjunção pouco teve a ver com uma estrela porque os dois planetas  maiores do Sistema Solar estavam próximos mas de forma alguma superpostos num único corpo. Foram propostas também estrelas  novas, alguns cometas, outras conjunções, como a de  Júpiter com a estrela Régulus (Pequeno Rei) na constelação  do Leão. Nenhuma destas alternativas deixou conformados a todos.  Em qualquer caso, é muito chamativo que apenas os magos do oriente perceberam a existência da estrella de Belém: no  há registros históricos de um fenômeno ao mesmo tempo impactante, mas que, segundo o próprio evangelista, nem mesmo Herodes teria notado. Não seria melhor considerá-la uma retórica simbólica?
Representação do céu próximo à cidade de Belém na noite de 28 de maio de 7 AC.
As estrelas mais brilhantes são Júpiter e Saturno, muito próximas,
na constelação de Peixes.  (Realizado com o programa Stellarium, v 0.12.0)
Da mesma forma que os  astrólogos magos  não sabem qué foi a estrela de Belém, tampouco nunca confirmaram nenhuma de suas outras afirmações.  É confuso então que Vicente Massot escreva em La Nación de 3 de janeiro de 2014 (link para a nota), que a Astrologia iria pôr as bases da moderna astronomia. Sejamos mais precisos. Uma disciplina  nascida entre os rios Tigre e Eufrates em torno do ano 2000 AC, evoluiu em duas direções diferentes: a do  pensamento rigoroso e verificável que chamamos Astronomia e a do tratamento simbólico e místico que chamamos   Astrologia. Apesar do afirmado, o afastamento (estranhamento?)  da Astrologia com a objetividade   começou já em tempos da Grécia Clássica: seus filósofos naturais descobriram  que o caminho do Sol no céu ia mudando lentamente (hoje atribuimos este fenômeno à  precessão do eixo da Terra), e assim os signos do Zodiaco já não se correspondiam mais com aqueles definidos dois mil anos antes. Com o passar dos séculos, as contradições aumentaram. Por exemplo: De qual forma incorpora  a Astrología os astros descobertos recentemente?  A quais?  Plutão, ainda usado nas Cartas Astrais,  foi reclassificado recentemente como planeta menor, mais um dos milhares  que abundam no Sistema Solar. Seria para levar em conta todos os outros também?  E as galáxias, não deveriam ser incluidas nas Cartas Astrais?Qual é a influência do Buraco  Negro no Centro Galático?  E as estrelas pulsares?  De que forma afeta nossa Carta Astral a expansão do Universo? 

Reflexionaram os astrólogos alguma vez sobre estas questões?  Duvido.  Não há na sua história nenhuma inovação relevante: continua a ser o mesmo olhar surpreso e curioso dos homens que davam seus primeros passos na civilização, quase 4000 anos atrás.  Enquanto isso,  a Astronomia descobriu planetas, estrelas, galáxias, nuvens de gás, uma paisagem  apaixonante e completamente nova, insuspeita pelos magos do oriente. Também descifrou a matemática íntima do movimento planetário: a Lei da Gravidade. Compreendeu   a forma em que a luz das estrelas propaga-se no vácuo chegando até nós, e  descobriu outras formas de luz que nossos olhos não detectam. Ousou, medrosamente, tirar o centro do Universo do Centro da Terra e pensar que também as estrelas nascen e morrem,  que não são estáticas como afirmavam os astrólogos. E, num movimento que acreditou aproximá-lo daquele Déus dos magos, o astrônomo convertido em astronauta, caminhou sem proteção, literalmente  caindo, fora da base sólida da superfície terrestre.

Os astrólogos, apesar de negar qualquer interesse por uma confirmação independente, entusiasmaram-se quando Michel Gauquelin na década de 1950 publicou um estudo estatístico  sobre o momento do nascimento de esportistas famosos e a posição do planeta Marte  no céu: o efeito Marte como foi batizado, nunca confirmado por outros pesquisadores, seria, no entanto, uma demonstração de que o método astrológico está enganado.  Ô contradição!

O certo  é que, embora nascidos no mesmo berço, nada deve a Astronomia à Astrologia.  Apenas nos deixar sem graça quando alguém nos pergunta a profissão:  O Senhor é astrônomo? Qué interessante! Eu sou de Capricórnio.

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