sábado, 15 de diciembre de 2012

21 de dezembro de 2012: a uma semana do fim

E aqui estamos nós. A menos de uma semana de uma magna data. Aquela marcada para ser o Fim do Mundo.  Um novo Fim.  Em diferentes sítios de Internet, relógios mostram quantos dias, horas, minutos e segundos faltam para a hora H, como este sítio oficial do 21 de dezembro de 2012, onde também podem ver um vídeo do entediante anúncio do guia de sobreviventes para os meses de desastres que estão por vir.

Neste momento, enquanto escrevo estas linhas, restam apenas 5 dias e 14 horas.

Como já comentei no sítio dedicado às profecias de 2012: A Hora Última, desde que tomei contato com esta teoria fiquei fascinado.  Fascinado por sua propagação mundial.  Por qué este Apocalipse tem mais chegada que outros anteriores?  É porque tem a ver  com os maias, povo extinto? Hollywood nos entregou, com seu filme 2012, uma descrição luxuosa em detalhes, barroca no estilo e absurda nos conteúdos do que irá nos acontecer em... menos de 7 dias.  Supostos meios de divulgação científica, como o Discovery Channel, aportaram sua dose de confusão criando documentários extravagantes e sesgados, longe dos afazeres e as preocupações dos cientistas de carne e osso que cada dia se desdobram para arrancar da austera natureza uma mínima amostra de conhecimento.  Também a TV local fez seu aporte. As mesas das livrarias inundaram-se de textos vários que contam de formas diferentes o signficado profundo desta época.  Todos eles dizem que haverá sinais externas, fenômenos que objetivamente todos poderemos observar, que nos indicarão o fim das épocas.

E eu, declarado atéu dos Apocalipses, dediquei tempo e esforço para desmontar esta intriga criada por  autores norte-americanos,  que uns 30 anos atrás encontraram fracos argumentos a favor de uma teoria desmesurada.  Foquei nos sinais, os fenômenos objetivos.  Tanto nas páginas do sítio Web que criei especialemente, como neste blog mais dinâmico, analisei àqueles que parecem mais significativos. Meu veredicto é que no há motivo nenhum de preocupação.

Recapitulando

O argumento fundamental é o suposto fim de um ciclo calendárico maia antigo, a Contagem Longa, quando chegue o dia 13.0.0.0.0 desse calendário. Na verdade não é completamente seguro que a Contagem Longa seja periódica.  Nos  códices maias, escritos durante o período pósclássico (depois do ano 1100), aparecem datas que ultrapassam este número.  Mais importante ainda, recentemente foram descobertas inscrições num templo, datadas na época preclássica (entre os anos de 2000 AC e 250 DC), quando o calendário era criado, que apresentam a data 17.0.1.3.0 muito posterior ao 13.0.0.0.0. Os maias abandonaram a Contagem Longa durante o período posclássico, talvez até perderam interesse nela.  Quando os espahnois aportaram em suas terras, no ano de 1524, o sistema já não era mais usado: como poderíamos nos informar então?

Mas, ainda se acreditássemos que efetivamente o calendário recomeça o dia maia 13.0.0.0.0, como saber a qual data de nosso calendário (o gregoriano) corresponde?  Os calendários maias não têm qualquer base astronômica. A sincronização entre ambos os sistemas de contar datas é muito complexa e sujeita a erros.  Eu juntei, na tabela abaixo, algumas das datas prováveis  para o dia 13.0.0.0.0. Na primeira coluna aparece o autor do trabalho, na segunda o número usado para correlacionar os calendários, na terceira aparece o dia gregoriano correspondente à origem do calendário maia (0.0.0.0.0) e na última temos a data gregoriana do suposto fim (e recomeço) do calendário maia. A linha com fundo cinza, ressalta o valor que os autores norte-americanos das profecias maias consideram quando afirmam que estamos nas vésperas de um câmbio universal.  Note-se no entanto, que essa data corresponderia ao 23 de dezembro e não ao 21 como é proclamado. De resto, vemos que o Fim da Contagem Longa poderia ter acontecido em 1734 ou poderá vir a ocorrer em 2532.

AutorValor 0.0.0.0.013.0.0.0.0
Smiley48269926 Jun 3392 AC5 Nov 1734
Makemson48913811 Fev 3374 AC22 Jun 1752
Spinden48938415 Out 3374 AC23 Fev 1753
GMT*58428513 Ago 3114 AC23 Dez 2012
Böhm 622261 4 Ago 3010 AC14 Dez 2116
Kreichgauer62692714 Mai 2997 AC 23 Set 2129
Wells, Fuls66020827 Jun 2906 AC 6 Nov 2220
Hochleitner67462522 Dez 2868 AC 3 Mai 2259
Escalona Ramos67910827 Mar 2874 AC5 Ago 2272
Weitzel7740783 Abr 2594 AC12 Ago 2532
*GMT significa Goodman, Martínez e Thompson. Outro valor frequentemente citado de GMT é 584283. Com este valor 13.0.0.0.0 é no 21 de dezembro de 2012. 

Os Sinais

Os apocalipses vêm sempre precedidos por sinais.  Os deuses (ou o Deus) os enviam para alertar os bons que devem atuar para se proteger.  Os sinais nos tempos modernos pretendem ter base científica.  E no caso das profecias maias não é diferente.  Três são as versões mais conhecidas (na lista adicionamos mais uma) :

  1.  Supertempestade Solar.  Sabemos há 150 anos que o Sol tem violentos desprendimentos de matéria e energía que alteram o meio interplanetário onde se encontra a Terra. Sabemos também que as tempestades solares têm sua frequencia e intensidade moduladas pelo chamado Ciclo Solar, cuja representação mais característica é por meio do índice de manchas.  O Ciclo Solar tem uma duração aproximada de 11 anos (mais ou menos 3) e neste momento atravessamos um periodo de aumento da frequência de tempestades solares: é o que denominamos máximo de atividade solar.  Sabemos por último, que dada a distância que nos separa de nossa estrela central e a atmosfera e magnetosfera terrestres, os efeitos das tempestades solares são muito pequenos para a vida na Terra, de fato o fenômeno passou despercebido por milhares de anos, e só foi descoberto por acaso usando um telescópio em 1859.  Os profetas chegaram a afirmar que este ciclo sería mais intenso que os anteriores e que uma tempestade solar poderia pôr em perigo toda a humanidade, embora sem indicar como.  (Também tem autores do âmbito científico que deram voz de alarme, de maneira completamente irresponsável. Ver esta série de posts: 1, 2 e 3).  No entanto estamos monitorando a atividade solar (é, por outra parte, minha especialidade profissional) e muito pelo contrário o Sol mostra sinais de fadiga. Como já fizemos no passado, mostramos na figura abaixo a atividade do sol no passado recente atualizada até o mês de novembro. A curva preta representa o índice de manchas observado, a curva vermelha, a previsão a futuro.  Como pode-se ver, o índice é hoje  metade do que era durante o anterior pico da atividade.  E a tendência é seguir assim. Aliás, a atividade dos últimos 15 días foi muito esparsa, então esperamos que para o dia 21 de dezembro não haja muitas novidades.
  2. Inversão do Campo Magnético Terrestre.  Este fenômeno natural, que já aconteceu muitas vezes no passado, suscita também a preocupação dos profetas que afirmam que será um sinal mais, e que virá acompanhado por crises mundiais, sociais e econômicas. No entanto não há razão para supôr que a inversão acontecerá nos próximos dias. O processo, que talvez já começou, leva milhares de anos para se completar, o último aconteceu há quase um milhão de anos.  As escalas temporais geológicas são longas.  Mesmo se o campo se inverter dentro de pouco tempo, não é muito lógico pensar que irão acontecer desastres.  Ao final de contas já aconteceu centenas de vezes no passado e tanto a vida em geral, como o homem em particular sobreviveram. Mais informações aqui e aqui.
  3. Alinhamento Galático. Diz a profecia que o Sol e o centro galático ficarão numa linha reta um com o outro, que esse dia será o 21 de dezembro, data do solstício, e que então poderosos jatos emanados do Centro Galático atingirão a Terra.  Dizem também que esta coincidência só acontece a cada 26.000 anos por culpa da precessão dos equinócios.  Mostramos que não há qualquer  alinhamento previsto para a data, nem para os 200 anos entre 1900 e 2100. Também escrevemos, que não há nenhum jato galático que possa nos afetar.  
  4. Asteróide. Menos citado, sempre aparece a suposta existência de um asteróide em direção da Terra. A menos de uma semana, se com todos os telescópios que observam o céu em busca de asteróides assassinos aínda não foi detectado é porque deve estar por trás de Júpiter e assim apenas nos poderia fazer algum dano dentro de muitos anos. À presente, apenas dois asteróides escapam da clasificação 0 (nenhum perigo) da Escala de Torino, para 1 (risco baixo) e as datas previstas de aproximação da Terra são entre 2040 e 2057. A Tabela completa está neste link.
Se devemos nos basear nestes sinais para acreditar na proximidade de uma catástrofe,  não vamos ser convencidos. Muito próximos da data, seguimos sem ver nenhum deles.  Por esse motivo não nos cabe a menor sombra de dúvida ao dizer que o curso da história da humanidade continuará muito além do 21 de dezembro de 2012, com suas misérias e grandezas.  Também não temos dúvida que novos profetas já estão escrevendo sobre os próximos apocalipses que também nunca irão a acontecer.  

Nos propusemos desde o início de nosso trabalho, que este blog  leve uma voz otimista com a visão científica.  E assim continuaremos.

Porque nossa  Última Hora ainda não chegou.

miércoles, 5 de diciembre de 2012

Alinhamento Planetário sobre as Grandes Pirâmides Egipcias

Nas redes sociais circula uma foto que fala de um alinhamento planetário, uma estranha disposição de Saturno, Vênus e Mercúrio que, quando fotografado próximo das grandes pirâmides de Guiza, (Keops, Kefrén e Micerino, ou em seus nomes egípcios Jufu, Jafra e Menkaura) aparecem justo acima de cada uma das construções. A foto em questão tem o seguinte comentário: Alinhamento planetário sobre Guiza. Acontece unicamente a cada 2.737 anos. Abaixo a foto.
Pirâmides de Micerino, Kefrén e Keops (de esquerda para direita). Acima delas as três estrelas, supostamente Mercúrio, Vênus e Saturno numa estranha conjunção.

Obviamente que esta conjunção foi relacionada com as profecias maias (estranho que não falaram  que o ciclo é de 5128 anos, o uma Contagem Longa maia). A verdade é que a foto parece muito falsa, mesmo assim decidi  verificar a informação.  Em primeiro lugar temos que ver a orientação da foto.  O diagrama abaixo mostra a disposição das pirâmides mais famosas da antiguidade egípcia.
Diagrama das grandes pirâmides de Guiza, com os nomes acima. Fonte Wikipedia, acesso em 04/12/2012.
Comparando com a foto, o diagrama mostra que foi tomada desde o Sul, olhando em direção Leste, ou seja, direção Norte-Leste.  O segundo passo é verificar a posição relativa dos planetas.  A conjunção é real, Saturno, Vênus e Mercúrio estão muito juntos, e aínda próximos do Sol.  Justamente, por estarem tão perto do Sol, podem ser vistos unicamente antes do amanhecer, ou seja, olhando em direção Sul-Leste e não Norte-Leste.  Além do mais, a posição relativa dos planetas é muito mais vertical.  O diagrama abaixo representa o céu sobre Guiza em 5 de dezembro de 2012 as 6:34 da manhã (hora local) obtido usando o programa gratuito kstars

A linha verde representa o horizonte, SE indica a direção Sul Leste, o que fica debaixo não pode ser visto ainda.  Quase no centro, abaixo da linha verde, o pequeno círculo amarelo é o Sol (Sun), indicando que está por amanhecer, o céu deveria estar mais claro que na foto. Por cima do horizonte, em letras amarelas, vemos os nomes dos três planetas (Mercury, Venus, Saturn) ao lado de pontos brilhantes.  A mancha cinzenta representa a Via Láctea e vemos também as linhas ligando estrelas que representam as constelações.  Fica claro deste esquema, que a posição mostrada na suposta foto do alinhamento é completamente falsa.  Poderiamos também analisar as posições relativas das estrelas para ver a qué distância das pirámides nos deveriamos colocar para ver  a coincidência de um planeta sobre cada pirâmide, mas acredito que os elementos até aqui apresentados já mostram a falsidade da foto.

Que a suposta repetição deste estranho fenômeno (2737 anos) é pura invenção fica fora de questão. Sabendo que Saturno, o planeta mais lento dos três, tem um periodo orbital de 30 anos, podemos supor que suas conjunções com Vênus, que tem um periodo orbital de 224 dias, e Mercúrio, que orbita em torno do Sol a cada 88 dias, aconteçem a cada 30 anos aproximadamente.

A foto da conjunção, além de pouca qualidade fotográfica demonstra pouca investigação, porque não custa muito buscar uma foto das pirâmides em direção Leste olhando para o Sul e superpor os planetas na posição em que se encontram realmente.  Muito trabalho para uma questão tão efêmera.  Tão efêmera como as ideias que intenta difundir.  

É bem provável que a teoria da conjunção única continue. Por exemplo, em 12 de janeiro de 2013, depois de sobreviver ao Apocalipse veremos, como no diagrama da figura abaixo,  que Vênus, Plutão, Mercúrio, o Sol e a Lua estarão bem próximos.  Saturno estará afastado do resto (acima a direita na figura) e Marte estará entrando baixo a esquerda. Não causará muita impressão, no entanto, porque o Sol ofuscará os demais objetos.  Talvez esta conjunção seja merecedora do rótulo de única em 10.000 anos. Quem sabe venham nos contar que a última vez que foi vista  construían as pirâmides... Ou qualquer outra coisa, porque nesta época de propagação instantânea das ideias, a incontinência do enter vence qualquer reflexão.

Esquema que representa o céu as 8:34 do sábado 12 de janeiro de 2013 em Guiza olhando em direção Sul Leste.

jueves, 18 de octubre de 2012

A moderada atividade solar

A pouco mais de dois meses do dia em que profecias afirmam que as explosões solares provocarão blecautes de energia globais com duração de meses, danificando os circuitos elétricos dos satélites de comunicação e posicionamento, induzindo acidentes de aviação e acabando com o sistema bancário mundial. A nove semanas, ou mais precisamente 57 dias da data em que se aguarda o Fim dos Tempos, o maior responsável pelo caos final, nossa estrela central, o Sol, não parece estar por dentro destas ideias.  Muito pelo contrário seu comportamento é bem moderado, aquém das previsões dos físicos solares, que não eram nada alarmistas.

Gráfico da atividade solar.  Fonte: Space Weather Prediction Center
O gráfico acima mostra a evolução do ciclo solar.   No eixo das abscissas (horizontal) os números indicam  os anos.  No eixo das ordenadas (vertical) o índice de manchas: quanto maior esse número o Sol está mais ativo e provoca mais explosões, ejeções de massa, etc.  Cada pontinho preto representa a média do índice durante um mês calendário.  O último pontinho da direita é a média do mês de setembro 2012. A curva azul é uma média corrida para suavizar as variações rápidas e ver tendências em escalas temporais maiores.  A curva vermelha é a previsão feita por um grupo de estudosos do Sol em base a modelos e ao histórico da atividade nos últimos anos.  Como pode se apreciar do gráfico, a atividade presente nem atinge o depreciado nível previsto pela curva vermelha.

O sol não quer sair de sua letargia.  Acredito que teremos um verão solar muito frio.


miércoles, 22 de agosto de 2012

Apocalypse Not

Eu já disse muitas vezes que não gosto de Apocalipses. E a consequência de este meu ceticismo é que me levou a escrever este Blog. Escrevi sobre os novos Apocalipses, sobre os maias, mas também sobre aqueles originados nos âmbitos acadêmicos:  A Mudança Climática, ou o Blecaute Global e Derradeiro

A revista Wired  publica um interessante artigo de Matt Ridley onde expõe a sua maneira estas ideias que defendo aqui.  Para aqueles que se atrevam com o inglês, voilà o link: Apocalypse Not. Na visão de Ridley os clássicos quatro cavaleiros do Apocalipse, hoje em dia estão representados pelas substâncias químicas, as doenças, a população e os recursos naturais.  A cada um deles dedica uma seção e mostra como as piores profecias realizadas pelos mais respetados cientistas de sua época, não chegaram nunca nem sequer a comprometer a vida humana na Terra.

Apocalypse Not é também uma expressão idiomática que brinca com o título do famoso filme de Coppola, Apocalypse Now.  E o artigo de Ridley, apesar de me fazer sentir acompanhado, aumenta minha curiosidade por entender o mecanismo que dispara a obsessão por imaginar nossos próprios finais. 

Até o próximo Apocalipse.    


sábado, 11 de agosto de 2012

Atividade Solar em Julho

Figura tomada de http://www.swpc.noaa.gov/SolarCycle/
em 11/08/2012.
Como todos já savem, o ciclo solar está chegando a seu máximo. Junto con ele vieram desta vez as profecias apocalípticas: as baseadas na interpretação do calendário maia e as que fundamentam-se em estudos geomagnéticos. Ambas brigam abertamente por imaginar os cenários mais assustadores.  

O certo é que enquanto nossos profetas escrevem seus apocalipses, a Natureza encarrega-se por desmentr.  A figura mostra a situação atual da atividade solar.  Os círculos pretos unidos por traços indicam o valor médio do índice de manchas do mês, a curva azul é uma média que suaviza as variações e a curva vermelha é a previsão a futuro, os números no eixo horizontal (abscissas)  são os anos a partir de 2000. Depois do pico do mês de outubro do ano passado, a atividade diminuiu, logo aumentou um pouco mas faz vários meses que estabilizou.  A menos de um ano do máximo, o Sol segue estando muito calmado.  

A última grande tempestade solar aconteceu em março de 1989, aquele ciclo foi de forma geral muito mais intenso que o atual.  Deveriamos esperar que uma supertempestade venha a ocorrer nos próximos meses? Não parece lógico. Enquanto isso os apocalípses terão de buscar uma desculpa para explicar seu erro.

miércoles, 8 de agosto de 2012

Riscos de uma supertempestade solar (III)

No post anterior falamos das emissões solares geradas durante um evento explosivo, como uma explosão ou uma ejeção de massa coronal.  Vamos ver agora as ameaças destas emissões segundo as visões mais pesimistas.
Típica aurora Polar observada em latitudes altas.


Aurora polar avermelhada, as vezes observada em latitudes menores.
Buscando na literatura  encontramos que a origem das ideias mais catastróficas é um único autor: John Kappenman, engenheiro elétrico norte-americano, proprietario da firma Metatech Corporation, que faz consultoría e brinda assistência à linhas de transmissão elétrica em questões de interferência ambiental ou intencional. John Kappenman se dedicou nos últimos 20 anos a estudar os fatores que podem danificar ou desestabilizar a transmissão de corrente elétrica.  Em reconhecimento a seu trabalho a National Academy of Sciences, o Congresso e o governo norte-americanos o chamaram para pedir conselho.  Em vez  destes relatórios em que utiliza uma linguagem técnica e fria, vou me referir aqui a um artigo que publicou na revista IEEE Spectrum, em fevereiro de 2012.  Esta revista, embora dedicada à divulgação técnico científica, pertence à mais prestigiosa associação de engenheria elétrica do mundo, responsável também pela publicação das melhores revistas relacionadas com a transmissão de eletricidade, as telecomunicações e a computação.  Não é um tabloide lido por milhões de pessoas, pelo contrário é seguida por um pequeno grupo de profissionais com formação universitária.  Em suma, é lida por formadores de opinião e gente das mais altas hierarquias empresariais e governamentais.  Por isso mesmo me assustou a linguagem utilizada.

Eu vou a traduzir o primeiro páragrafo deste artigo:
Linguas luminosas de intensas cores vermelhas, verdes e violetas brilham e pulsam através dos céus do norte e do sul como vastas conflagrações cósmicas. Em minutos, milhões de pessoas estão tuitando, enviando mensagens de texto pelo celular e blogueando sobre a fantástica visão.  Mas, repentinamente, o céu torna-se de cor  sangue vermelho  e a fascinação dá passo ao pânico. 
 Como podemos ver o início presságia as catástrofes que anunciará depois.
Relacionado com o espetáculo celestial acontecem enormes variações do campo magnético na magnetosfera terrestre, que causam imensos fluxos de corrente elétrica na atmosfera superior sobre a maior parte do planeta.  Estas enormes correntes perturbam o campo magnético terrestre normalmente calmo, que por sua vez induzem oscilações de corrente nas redes elétricas e de comunicações  entre os continentes.  As luzes das ruas  piscam até apagar, a eletricidad desaparece. Um blecaute planetário está acontecendo deixando vastas regiões de Norte e Sulamérica, Europa, Austrália e Ásia sem energia. 
E as coisas vão piorando com o passar do tempo,  
Em poucos meses, a crise se aprofunda. Em muitos lugares a falta de comida crece vertiginosamente, a água potável passa a ser um bem precioso e os pacientes que precisam de transfusões de sange, insulina ou drogras críticas morrem enquanto aguardam.  O comércio normal pára, substituido por um mercado negro e o crime violento.  Enquanto  as fatalidades crescem por milhões, a rede social desaba.  
O qué pode justificar tamanho prólogo apocalíptico?  Temos evidências de que algo assim poderia vir acontecer?  Segundo Kappenman embora não há evidências observacionais, pode-se especular com esta catástrofe mundial. O fundamento de seus argumentos é a comparação dos efeitos criados pelas maiores tempestades magnéticas registradas nos tempos modernos.

Danos provocados aos transformadores da Companhia de eletricidade de Quebec durante o blecaute de março de 1989 (Fonte: Severe Space Weather Events, Nat. Ac. Sci., 2008)
A primeira (na verdade foram mais de uma) aconteceu entre o 28 de agosto e o 4 de setembro de 1859. Em coincidência, Richard Carrington, astrônomo aficcionado inglês, observou em 1 de setembro através de seu telescópio a primeira explosão solar. Não  se tratou apenas da maior white light flare (explosão em luz branca) jamais observada, essa semana aconteceram as maiores pertubações do campo magnético terrestre  enquanto era  observado o céu avermelhado (aurora polar, ver foto acima) até nos trópicos, e as linhas telegráficas chegaram a curtocircuitar, algumas prenderam fogo e em outros casos, tinham corrente elétrica para funcionar com as baterias desligadas. Estes fenômenos foram observados por vários dias.   Há muitas testemunhas  presenciais embora na prática temos pouca precisão sobre a extensão dos danos. Como argumento é referido o fato de que em 1859 o telégrafo era o meio de comunicação mais avançado da época, o que hoje estaria representado por comunicações satelitais e telefonia móvel.

A pregunta que se faz Kappenman e acredita ter uma resposta correta é: o qué ocasionaria hoje uma tempestade geomagnética parecida com a de 1859.  Para responder parte do caso da tempestade de março de 1989, que deixou sem luz a  provincia de Quebec.  As correntes geoinduzidas (GICs) pelas partículas que entraram na atmosfera durante a tempestade,  sobrecarregaram a rede de alta tensão, o que criou um curtocircuito que se propagou rapidamente a outras redes.  O apagão prolongou-se por 9 horas e produziu perdas milhonárias.  A maior preocupação de Kappenman é com os transformadores de ultra alta tensão (EHV em inglês) que podem queimar por culpa das GICs, a confecção dos mismos é quase artesanal e portanto sua reparação ou substituição é muito demorada.  Se em escala global muitos destes EHV queimaram começãria um problema muito sério: a falta de eletricidade em vastas regiões provocaria graves problemas de alimentação, falta de água potável, carência de transporte e riscos severos na conservação de medicamentos por falta de geladeiras.

Se Kappenman não poupa na descrição apocalíptica inicial é porque ele está convicto que centenas de transformadores poderiam sair de serviço se outro evento Carrington (como são chamados os eventos da semana de 28/8 a 2/9/1859) voltasse a ocorrer.  O fator decissivo nos prejuizos induzidos por uma tempestade magnética é a variação do campo magnético. Em março de 1989, mudou entre 400 e 500 nT/minuto (nano teslas por minuto), sendo dos mais importantes das últimas décadas. No entanto, Kappenmann mostra que  en 1921 outra tempestade geomagnética teria provocado variaciões de até 5000 nT/minuto e o evento Carrington foi aínda maior.  (Como referência, o campo magnético terrestre é em torno de 60.000 nT em média)
É este o cenário de catástrofe que melhor descreve as predições de Kapenmann? A sociedade destruida, homens caçando homens. Frio, falta de alimentos, água e medicamentos. The Road, filme de John Hillcoat, estrelado por Vigo Mortensen.

Kappenman vai ainda mais longe. Ele especula com que poderiam chegar a acontecer centenas de Fukushimas.  Como?  Para compreender temos que ver como aconteceu o meltdown do reator japonês durante o tsunami de 2011: o terremoto disparou, por prevenção, o desligamento do reator, o tsunami ultrapassou o muro de contenção e a água invadiu a sala onde encontrava-se o gerador elétrico diesel de emergência, e a energia externa cortou quando cairam os postes elétricos por culpa do tremor. Em síntese Fukushima ficou em poucas horas sem nenhum tipo de eletricidade, por esse motivo não podia-se  fazer funcionar o circuito primário de arrefecimento, e o reator estava muito quente. No decorrer das horas e dias, o material começou a fundir e houve escape radioativo.  Então, se por culpa de uma tempestade geomagnética muitos transformadores EHV ficassem fora de funcionamiento, os reatores deverão ser desligados e passarão a depender do gerador diesel para fazer funcionar a bomba do circuito de arrefecimento.  Mas a norma é que os geradores têm combútivel apenas para uma semana.  Como o caos vai tomando cada vez mais lugar na cidade, a carência de combustível levará eventualmente a que os reatores fiquem sem nenhum tipo de energia e com o reator ainda quente demais. Em poucas semanas centenas de reatores no mundo todo começariam a fundir...

Todo este Pandemonium, poderia ser evitado facilmente diz Kapenmann, a ideia é isolar nas linhas de transmissão o neutro da terra por meio de um capacitor, o que evitaria que as GICs tivessem onde descarregar.  O problema é que as terras estão para evitar curtocircuitos quando a corrente cresce descontroladamente.  Nesse caso alguma chave deveria bypassar o capacitor. Esse dispositivo, baseado num tubo de vacúo já foi desenhado pela firma Advanced Fusion Systems, sendo capaz de atuar numa fração do ciclo  elétrico (digamos que uns 10 ms) e suportar até 20.000 A de corrente.  Só é necessario fazer estas modificações em todas as linhas de alta tensão do mundo a um custo  muito menor que os danos projetados en seus catastróficos relatórios.  O artigo de Kapenmann termina com uma advertência: Se não fazemos nada, se paramos a esperar que os políticos apreciem os riscos e atúem- podemos pressenciar uma das maiores catástrofes de todos os tempos.

Como já tenho dito em outras oportunidades, não gosto dos apocalípses, qualquer que seja a origem.  Kapenmann não apresenta  evidência alguma de que este seja mais real que outros já proclamados: sua base é mostrar que tempestades geomagnéticas anteriores foram de maior intensidade que a que afetou Quebec em 1989.  Mas não oferece relação empírica ou teórica entre a intensidade das correntes induzidas a partir das variaçõe do campo magnético.  Também não fica clara a distribuição destas correntes sobre a superfície terrestre, nem o fluxo necessário para queimar um transformador EHV. Desta forma sua conclusão apocalíptica é, no melhor dos casos, especulativa.  

Por enquanto tomei un articulo de divulgação. Em outros posts vou analisar os trabalhos científicos de Kapenmann, no que diz respeito a suas predições catastróficas.

miércoles, 25 de julio de 2012

Riscos de uma Supertesmpestade Solar (II)

Para poder avançar nesta questão devemos primeiro falar dos diferentes tipos de emissões que produze o Sol. Podemos resumi-las em três:
  1. Luz, que em sua forma mais geral chamamos ondas eletromagnéticas para incluir desde rádio-frequências, infra-vermelho, luz propriamente, ultra violeta e raios X.  As rádio-frequências, o infra-vermelho a a luz são capazes en maior ou menor medida de atravessar a atmosfera terrestre e chegar até a superfície, mas como são radiações não ionizantes, não representam nenhum perigo.  Já os raios-X e os ultra-violetas, perigosos para a saude, são quase completamente absorvidos na atmosfera.  Seus efeitos  só são sentidos nas camadas mais altas  ou no espaço exterior. Dada sua velocidade, são as primeiras evidência que recebemos de qualquer evento solar.
  2. Partículas carregadas. Pode se tratar de elétrons, prótons e néutrons, ou também de íons. Também são chamadas de raios cósmicos solares ou em inglês, Solar Energetic Particles (SEP). Estas partículas têm uma altíssima velocidade, próxima à da luz.  Os raios cósmicos não são capazes em geral de chegar até a superfície terrestre embora podem ser detectados de forma indireta pelos efeitos que provocam.  Como têm velocidades próxima à da luz, chegam uns minutos após às ondas.
  3. Ejeções de massa coronal.  Conformadas por uma grande quantidade de matéria (trilhões de kg) da atmosfera solar, transportam também  campo magnético. Sua velocidade de deslocamento é muito menor, entre 1.000 e 3.000 km/s. A massa solar é muito tênue e incapaz de atravessar a atmosfera terrestre, no entanto seu campo magnético  interage com o terrestre provocando efeitos visíveis, como as chamadas auroras polares.  Demoram em arribar à Terra entre 1 e 3 dias aproximadamente.
Durante as chamadas tempestades solares, uma ou  até as três formas de emissão podem estar presentes.    A discusão sobre seus efeitos é o miolo destes artigos. Em princípio podemos resumi-los da seguinte maneira: 1) e 2) afetam só os satélites danificando circuitos eletrônicos, fazendo-lhes perder sua orientação, gerando distúrbios que inibem a conexão com a base na Terra, colocando em risco a saude dos astronautas. 

As ejeções de massa têm um efeito indireto: a interação do campo magnético terrestre com o da ejeção pode provocar o ingresso na baixa atmosfera terrestre de uma gran quantidade de partículas. No vídeo acima pode-se ver uma animação de uma ejeção preparada pela NASA, desde que sai do Sol até que chega na Terra. Perto da Terra, os campos magnéticos entram em contato, as linhas sofrem uma reconfiguração e partículas carregadas que se encontram no espaço saõ aceleradas e entram pelos pôlos, onde o campo magnético é de maior intensidade.   São estas partículas as responsáveis de criar as auroras polares.  Também podem induzir correntes nas linhas de alta tensão sobrecarregando-as. Na visão de John Kapenmann, um engenheiro elétrico norte-americano e dono d euma firma de consultoria sobre segurança em redes de transmissão, este é o maior perigo que enfrentamos caso una supertempestade solar venha acontecer.  

É sobre este tema que vamos falar no próximo post.

domingo, 15 de julio de 2012

Riscos de uma supertempestade solar

O Solar Dynamic Observatory registra a erupção de uma
proeminência em 16 de abril de 2012
Na medida em que a atividade solar continua aumentando em direção a seu máximo esperado para o trimestre maio-julho 2013, impactantes imágens de temspestades solares saõ publicadas na mídia. Embora a fama solar repete-se a cada um de seus máximos (lembro que o ex-diretor do Instituto Max Planck en Katlenburg-Lindau gostava de mostrar a capa do tabloide alemão Bild, com uma foto de uma explosão solar ao lado de um mulher semi-nua), desta vez foi  adicionado um elemento que aumenta o seu dramatismo: a mídia alerta para as consequências catastróficas que uma dessas tempestades poderia produzir na Terra.  Desde um blackout elétrico generalizado com duração de semanas ou meses, até acidentes aéreos fatais originados na interrupção do serviço de posicionamento brindado pelo GPS.

Parte destes relatos é encontrado uma e outra vez nas profecias maias de fim de mundo.  Por exemplo no livro Apocalypse 2012 do jornalista  Lawrence Joseph e em documentários dos canais Discovery Channel e History Channel.

A primeira vez que ouvi estes relatos apocalípticos parecera-me fora de toda lógica e supus que sua origem poderia estar nos ambientes  fatalistas afastados da ciência ou da tecnologia.  Posteriormente pude rastrear os fundamentos destas teorias e cheguei até alguns documentos produzidos nos mais nobres centros de pesquisa científica como a National Academy of Sciences dos EUA. Minha perplexidade só aumentou com esta descoberta.  Assim que antes de continuar escrevendo sobre a questão acometi contra os informes que dão base a tamanha pavura.  Numa série de posts vou-me a referir a eles, além de  outros documentos, que relativizam o cenário de destrução massiva. Não vão ser artigos fáceis nem curtos, intentarei ser rigoroso e crítico ao mesmo tempo.  Posso no entanto adiantar meu pensamento:  as conclusões catastróficas derivadas destes informes estão exageradas e baseiam-se em incontáveis condicionais.   

Stay in touch.

sábado, 26 de mayo de 2012

A mais antiga tabela astronômica maia

As ruinas de Xultun, Guatemala,  foram descobertas em 1915, e embora começaram a ser estudadas arqueologicamente em 1920, ficaram abandonadas à depredação dos caçaadores de tesouros.  Foi por graça destes piratas que em 2010 decobriu-se a entrada a uma  abóbada rica em paredes ornamentadas com pinturas.  Umas semanas atrás os resultados preliminares da pesquisa apareceram publicados na revista Science: Ancient Maya Astronomical Tables from Xultun, Guatemala, de W. Saturno, D. Stuart, A. Aveni y F.Rossi (Science 336, 714, 2012). A abobada é datada  no período clássico maia. Em uma de suas paredes (a leste) podem ser vistos números maias, no formato de pontos e linhas. Apesar que o tempo apagou alguns hieróglifos, o grupo de arqueólogos, entre os quais se encontra Anthony Aveni, célebre investigador da cultura astronômica maia e autor do livro Observadores del cielo en el México antiguo (Ed. Fondo de Cultura Económico), acredita ser posível determinar sem muito erro algumas sequências formadas. Uma das conclusões do grupo de autores é que os números representam intervalos de dias, relacionados com lunações, de uma forma que lembra o Códice de Dresde escrito durante o período pos-clássico (pelo menos 500 anos depois destas pinturas). Em outra parede há quatro colunas de 5 números de pontos e linhas escritos verticalmente, cada coluna posui um tzol'kin de cabeçalho, embora estes não foram descifrados.  No entanto cada um dos números distribuidos verticamente  são legíveis e parecem formar datas da Contagem Longa. Eles são:

                          Maya                 Dias                    Anos
                      8.6.1.9.0     1.195.740     3273,8
           2.7.9.0.0       341.640      935,4
          17.0.1.3.0     2.448.420     6703,5
          12.5.3.3.0     1.765.140     4832,8   

Na primeira coluna da tabela aparecem  os números em sistema maia.  Lembramos que a Contagem Longa  consistia em contar os dias, utilizando uma base (quase) vigesimal (20) que, por uma razão desconhecida ainda, terminava no número 13.0.0.0.0 também chamado 13 bak'tuns e que, segundo alguns arqueólogos, vai acontecer no próximo 21 de dezembro de 2012.  A segunda coluna transforma o número maia a nosso sistema decimal mostrando o intervalo em dias.  E, por último, considerando nosso calendário gregoriano, a quarta coluna mostra o intervalo em anos. Como pode ser apreciado, são intervalos muito longos, de milhares de anos.  Os investigadores acreditam que não se trata de datas, mas de intervalos, periodos que deveriam ter relação com outros períodos.  No entanto, não foi encontrada relação alguma entre estes números e os pintados em outras paredes, e tampouco existem conexões claras com ciclos astronômicos (de Vênus e a Lua por exemplo) ou calendáricos  (o Ciclo do Calendário) conhecidos dos maias. A conclusão do artigo é que por sua semelhança com tabelas escritas no Códice de Drede, única evidência escrita dos conhecimentos astronômicos maias, estes se remontaríam a períodos anteriores ao pos-clássico.

Chama a atenção qua o terceiro algarismo corresponde a 17 bak'tuns, um número que ultrapassa a duração de uma Contagem Longa  em 570.420 dias ou 1578 anos (no Códice de Dresde também há números parecidos).  Se a Contagem Longa representa um ciclo do Mundo, um voltar a começar, qual é o sentido de um intervalo maior?  Poderiamos argumentar  que os maias não pensavam que o que aconteça no fim do calendário, será tão grave como para modificar as órbitas de Vênus, Mercúrio ou a Lua, e que seguirá havendo habitantes na Terra para contemplar as noites estreladas.

Maiormente, este descobrimento demonstra nossa ignorância  sobre o Calendário Maia e os conhecimentos astronômicos deste povo, que, e na minha humilde impressão, estão sobrevalorados. E reforça minha opinião que as profecias nada mais são que interpretações incoerentes de nossa sociedade.

lunes, 21 de mayo de 2012

O Sol de abril

A atividade solar durante o mês de abril não trouxe grandes surpresas, o índice de manchas diminuiu um pouco e isto resultou também em poucos eventos explosivos.  A figura abaixo, gerada pelo National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) dos EUA é um reflexo disto.  Depois de um leve incremento durante o mês de março (anteúltimo ponto preto do gráfico), o índice médio de abril cai para um valor em torno de 55 (último ponto da curva preta). Como sempre, a curva azul representa uma media corrida da atividade pasade e a curva vermelha é a previsão para os próximos anos, com máximo para maio de 2013.

Como cantava The Police nos '80: There's a little black spot on the sun today. It's the same old thing as yesterday.*


Figura gerada pela NOAA e acessa em 21/05/2012. Ver  seguinte link
* Há uma pequena mancha no Sol hoje, é a mesma de ontem.

miércoles, 9 de mayo de 2012

Observação do trânsito de Vênus a olho nu

Dentro de menos de um mês teremos o último trânsito de Vênus deste século XXI. Sendo um fenômeno relativamente infrequente está despertando bastante atenção. Infelizmente no hemisfério Sul de América não poderemos observá-lo.  No entanto muitos instrumentos de todo o mundo, incluso em satélites, e a maioria dos astrônomos amadores que tenham a oportunidade, farão observações do fenômeno. Tanto interesse chegou  a Internet, onde já vi avisos de venda de óculos que permitem observar "eclipses e trânsitos de Vênus". Se trata de "bloqueadores", filtros que inibem grande parte da luz solar, permitindo olhar diretamente o disco sem sofrer danos.  Eu, por exemplo, tenho uma placa fotográfica negativa, completamente preta e que me deixa olhar o Sol sem perigo.  É bom lembrar, no entanto, que a observação direta do Sol pode danificar permanentemente a visão. Cuidado!!  Este método não conta com nenhum tipo de ampliação de imágem.  Observar eclipses solares resulta óbvio, mas, eu pergunto  se o trânsito de Vênus pode também ser observado a olho nu, sem ajuda de  telescópio.  Como seria? 

O Sol tem un diâmetro de 1.400.000 km e se encontra a uma distância de 150.000.000 km aproximadamente.  Dividendo o primeiro número pelo segundo obtemos o ângulo subtendido pelo disco solar para um observador terrestre sem instrumentos:

                      a = 140.000 / 150.000.000 =  0,0093 radianos

O que significa isto?  A uma distância de meio metro (comprimento de um braço) o disco solar é aparentemente tão grande como um círculo de um diâmetro de

                      d =  0,0093 x 500 mm = 4,7 mm !!

Podem comprova-lo usando a Lua cheia, cujo tamanho aparente não é muito diferente ao do Sol.  Tomem uma régua transparente, segurem-na com uma mão e extendam o braço reto, em direção para a Lua. Confiram na régua que o tamanho é um pouco menor a 5 mm.

Se o Sol tem esse tamanho, qual será o de  Vênus?  Quando o vemos de noite em sua versão de Luzeiro do entardecer, Vênus é como qualquer outra estrela, é seu brilho que se destaca no fundo escuro.  Mas quando fique acima do disco solar, teremos que percibir uma pequena sombra escura acima de um círculo extremamente brilhante.  Vênus tem um tamanho aparente máximo de

                          av =  1 minuto = 0,000276 radianos

ou seja que à mesma distância do braço (meio metro)

                          dv =   0,000276 x 500 mm = 0,138 mm = 138 microns

Vênus fica do tamanho de um décimo de milímetro. O olho humano tem uma acuidade nominal de 1 minuto de arco (visão 20/20).  Ou seja que é capaz de ver separadas duas linhas paralelas uma a um 1 minuto de arco da outra. Sendo assim, o tamanho de Vênus fica justo no limite,  porque  a maioria das pessoas tem uma acuidade menor que, por outra parte, depende muito das condições de iluminação e da forma do objeto. Lembrem que queremos distinguir um pontinho escuro sobre um fundo intensamente brilhante. Podem fazer um teste usando a foto abaixo (obtida do site de Jeff Balls). Meçam com uma régua o tamanho do Sol na tela do computador (no meu caso deu 11 mm). Calculem agora

                                                distância = (Diâmetro Sol) / 0,0093

Minha conta deu
                                               distância = 11/0,0093=1.182 mm = 1,18 m

Fiquem a essa distância da tela e olhem  para a foto do Sol.  Tentem distinguir o pequeno ponto preto quase na borda direita, um pouco embaixo do diâmetro central: aqui têm a imágem original como referência.  Esse ponto é Vênus fotografado com um telescópio de 600 mm de distância focal durante seu último trânsito em 2004. Eu, particularmente, apesar de saber o lugar preciso onde se encontra,  a 1,2 m de distância da foto, não o enxergo. E vocês?

Copyright © 2012, Jeff Ball. All rights reserved.
A pergunta é relevante e diz respeito as profecias de 2012.  Comentamos que alguns arquélogos acreditam que os maias poderiam ter observado trânsitos de Vênus. À luz dos cálculos anteriores e do meu teste, me parece muito difícil.  Seria interessante saber se na história há relatos de observações de trânsitos de Vênus sem ajuda de telescópios.  Até onde eu busquei, não achei.  Por exemplo, aqui, as observações começam depois de 1609, ano da introdução do telescópio na astronomia. 

lunes, 9 de abril de 2012

Atividade Solar em março: uma atualização

A Administraçaõ Nacional do Oceâno e a Atmosfera (por sua sigla em inglês NOAA) do governo norte-americano acaba de publicar os dados da atividade solar referente ao mês de março e atualizou a curva do ciclo solarNum post anterior já falamos do pico  de atividade que chamou a atenção da mídia de todo o mundo pela quantidade de explosões solares e ejeções de massa.  No entanto e apesar de tanto ruido, poucas foram as nozes: a atividade em geral manteve-se bastante mais abaixo que a registrada no mês de novembro. No entanto, ela  reverteu a tendência para abaixo respeito dos meses de dezembro, janeiro e fevereiro.  Por enquanto, o començo do mês de abril mostra-se muito tranquilo com poucas manchas e eventos de categoria baixa.  
Ciclo solar. Os pequenos círculos pretos representam a média mensal do Índice de Manchas. A curva azul é uma média corrida. A curva vermelha é a projeção para o futuro.

sábado, 24 de marzo de 2012

A atividade solar de março de 2012

Nas últimas semanas fomos invadidos por imagens e reportagens falando sobre a atividade solar.  Somente no CRAAM, onde eu trabalho, vieram duas  equipes da Globo e uma da TV Cultura para fazer entrevistas, além do portal do MSN Brasil e ainda houve contatos telefônicos com outros jornalistas que se comunicaram para obter precisões: está aumentando a atividade solar?  

Pois é, a atividade solar deu um salto: desde os primeiros dias de março o Sol se mostrou bem ativo com muitas explosões e ejeções de massa com efeitos sobre a Terra.  Tudo isto agitou os fantasmas das profecias de 2012, daí o interesse redobrado da mídia.  Mas, será que há algúm motivo de preocupação?  

Muitas vezes já falamos sobre o Ciclo Solar, mas é bom voltar sobre ele.  O Sol apresenta dois comportamentos muito diferentes: um inverno calmo e um verão ativo, entre ambas as estações solares se passam em torno de 5 anos.  Estamos agora no verão solar, embora ainda não chegamos no ápice.  Por isso, manchetes de jornais dizendo, "foi registrada a maior explosão solar dos últimos 5 anos" é semelhante a dizer um 20 janeiro, por exemplo, que foi registrado o recorde de temperatura dos últimos 6 meses.  A comparação correta é com os verões anteriores. E para isso, no caso solar,  devemos voltar 11 anos aproximadamente.  É isso o que eu fiz.  Na figura abaixo apresento o fluxo em raios-X mole observado pelo satélite da séries GOES durante o periodo 3 a 23 de março deste ano.  O fluxo em raios-X é um atividômetro: um medidor da atividade solar, quanto mais intenso o fluxo, mais ativo o Sol, maior número de explosões e ejeções de massa, maior a chance de efeitos na Terra.  As linhas horizontais representam a classificação da emissão em raios-X: A, B, C, M  e X. Cada banda de energia é 10 vezes maior que a anterior. Os eventos X são os mais importantes os M são médios e embaixo estão os eventos pequenos. Duas vezes no periodo da figura tivemos fluxo X, e uma dezena o fluxo foi M.  O valor mínimo do fluxo (a base) sempre foi maior do que B.  


Comparemos a figura acima com o verão de 2003 durante o periodo de 15 de outubro a 6 de novembro: 12 eventos X, incontáveis eventos M, a partir de 22 de outubro o fluxo era sempre mais intenso que C. Fica bastante claro que, embora ainda falta para o fim da estação ativa,  o verão de 2000 - 2003 foi bastante mais quente que o atual.  


Só basta ver a figura abaixo para comprová-lo. Ela representa a evolução da atividade solar medida por meio do Índice de Manchas.  Cada ponto é a média mensal. Em outubro do ano passado houve também uma agitação intensa no Sol, mas a atividade como um todo decaiu abruptamente nos seguintes meses. O último ponto corresponde a fevereiro passado.  A curva vermelha representa a progressão esperada do ciclo. Até agora a previsão parece estar sendo cumprida muito bem.



Conclusão: se algo tem de particular este verão solar, é que ele está bastante frio.

domingo, 18 de marzo de 2012

Observações maias de trânsitos de Vênus

Um leitor anônimo deste blog em espanhol me alertou por meio de um comentário no post El tránsito de Venus del 6 de junio de 2012, que o professor Jesús Galindo Trejo do Instituto de Astronomía da Universidad Nacional Autónoma de México, depois de analisar afrescos de um templo da cidade de Mayapán especula  que os maias observaram trânsitos de Vênus. Este fato poderia abrir as portas para a interpretação dos profetas de 2012 de que o calendário maia da Contagem Longa, está sincronisado para coincidir seu final con um trânsito de Vênus que acontecerá em 6 de junho próximo.

Não foi difícil encontrar o trabalho de Trejo publicado no Número XXIX da revista Estudios de Cultura Maya: Un análisis arqueoastronómico del edificio Q152 de Mayapán. Vou resumir os aspectos que me interessan aqui.
Prédio Q152, também chamado de Observatório.
Mayapán, Mérida (México)

A cidade de Mayapán, última grande orbe maia, pertence ao período posclássico (aqui uma breve descrição da história maia precolombiana). Teve seu apogéu entre 1200 e 1450 e um declínio dramático, produto de revoltas populares apoiadas por grupos armados provenientes de México central. Conta com importantes edificações, entre elas um templo circular que recebeu o arqueológico nome de Q152 (as vezes referido como o observatório) e uma pirámide chamada o castelo. Recentemente num pequeno prédio junto ao castelo foram achados e restaurados uns afrescos que são iluminados pelo sol en dois dias precisos do ano. Uma das imagens representa o sol amarelo com grandes raios, escoltado por dois personagens com umas espécies de lanças; e dentro do disco solar há um personagem ricamente ataviado em aparente descenso.  Segundo Galindo Trejo, os dias em que o sol ilumina o afresco serviriam como marcadores que permitem fazer uma aritmética simples para contabilizar o período sinódico de Vênus, de 584 dias, tempo que demora em dar uma volta em torno ao Sol observado desde a Terra.  Tamanha importância dada ao ano de Vênus, leva ao autor a reflexionar se o personagem dentro do disco solar não se trataria de uma representação dos trânsitos do planeta, tornando o afresco numa evidência do conhecimento astronômico maia.
Pirámide de Mayapán (o castelo)

Observar tránsitos de Vênus é complicado porque  projetado sobre o disco solar, o planeta é 30 vezes menor.   No entanto é possível se se atenua de alguma forma a intensa luz solar.  Uma condição natural é com o Sol próximo do horizonte ocultado por um véu de nuvens ou por fumaça.  Os maias estavam  numa posição geográfica privilegiada: dos 40 trânsitos de Vênus que aconteceram entre o ano 2000 AC e 1500 DC (conquista espanhola) eu calculei que poderiam ter observado 36 (Usei a seguinte tabela criada pela NASA, e as fórmulas daqui). Os trânsitos de Vênus são fenômenos bastante prolongados, que duram aproximadamente 7 horas e que ocorrem com pouca dispersão calendárica: entre o 19 e 23 de maio, e entre o 20 e 23 de novembro quando é considerado o lapso correspondente à antigüidade maia. Nem todo ano tem tránsito de Vênus, no entanto. As regras que os regem  não são simples e exigem séculos de observações ou um conhecimento bastante avançado da astronomia planetária.

Tamanhos relativos do disco solar (círculo amarelo) e Vênus (círculo azul claro). A diferença de tamanho e o intenso brilho solar dificultam a observação sem instrumentos de um trânsito de Vênus.

Em suma, talvez os maias observaram tránsitos de Vênus. Supor que chegaram a prevê-los, como algumas profecias de 2012 afirmam, seria uma ousadia sem qualquer sustento científico.

miércoles, 29 de febrero de 2012

2012 no Discovery Channel: a perda da ética do jornalismo científico

O Discovery Channel preparou um documentário especialmente dedicado às profecias de 2012 que foi ao ar no mês de fevereiro desse ano.  Com o sugestivo título de Apocalypse 2012 o programa entrevistou  a John Rennie, editor da revista Scientific American, e  Ian O'Neil, físico solar pela Universidade de Gales, produtor do site Discovery News e criador do site Astroengine. Junto com eles estavam Edwin Barhnhardt do Maya Exploration Center, e Holly Gilbert e C. Alex Young, ambos físicos solares do Goddard Space Flight Center de NASA. Com semelhante elenco tudo indicava que o programa não daria trégua às críticas céticas contra as profecias de 2012.

E no entanto, as últimas frases do documentário foram : Mas os especialistas podem estar errados e em 22 de dezembro de 2012 os vivos podem chegar a invejar os mortos.  Se o mundo acabar não haverá como negar uma simples verdade: nós fomos avisados. Enquanto a voz do locutor lia essa profecia apocalíptica, imagens  mostravam um mundo que se destruia por causa de terremotos gigantescos, tsunamis e demais pragas de fim de mundo numa dantesca dança completamente irreal produto da imaginação de roteiristas de Hollywood, talvez tiradas do filme 2012.   Não resulta um tanto estranho esta mensagem final num canal que diz que seu alvo é a família, a informação a educação e o entretenimento?
 
Faltou mencionar que no grupo de convidados estava Lawrence Joseph: jornalista e autor do livro Apocalypse 2012, uma visão supostamente científica de como o mundo poderia acabar esse ano, que já leva vendidas mais de 100.000 cópias segundo o seu próprio site.  Talvez é aqui onde começamos a compreender a moral do documentário (as letras itálicas indicam minha visão crítica de que realmente se tratou de um documentário) do Discovery Channel. Não é divulgação científica, mas um show mediático onde a ciência é um ator coadjuvante: ela não é o centro mas sem ela não teria espetáculo.  Talvez pior ainda, foi um golpe de marketing para relançar as vendas do livro de Lawrence.

Divulgação científica é ciência também.  Ela é até mais difícil de fazer porque deve tentar ser rigorosa na explicação, sem utilizar recursos lingüisticos ou matemáticos  sofísticados.  Isso coloca qualquer cientista numa posição difícil porque a maior parte do tempo ele passa dentro de um ambiente pleno de significados. Fora dele, deve substitui-lo com outras descrições mais generalizadas.  Não se trata de usar palavras simples ou alegorias frouxas, mas de buscar alternativas à explicação.  Não é fácil, e muito poucos conseguem. Em qualquer caso a divulgação científica tenta colocar no público leigo as ideias da ciência, mostrando os debates, mas tentando ser equilibrado enquanto ao que a maioria aceita como correto.

O Discovery Channel não parece se importar muito com essa visão. O entretenimento, custe o que custar vale mais do que o rigor, o efeito sobrepõe-se à precisão.  Da mesma forma Lawrence Joseph, cujo livro não conhecia antes de assistir o programa, parece brincar com as mesmas estratégias para conseguir maiores vendas.  Será que eles não se precoupam com as centenas de milhares de pessoas que estão angustiadas pela próxima chegada de um Apocalípse?  Pessoas que abandonam suas casas para buscar refúgio em sítios considerados seguros?  Quantos conflitos pessoais e sociais está criando esta histeria sem qualquer base científica?

Os dois astrofísicos do Goddard, são os únicos que não deixaram dúvidas quanto ao seu convencimento de que não haverá Apocalípse, embora a carinha ingênua da Holly afirmando "eu acho que não acontecerá nada em 21 de dezembro de 2012", ou a frase de Alex Young: "não há nada de especial em 2012", foram muito pouco para contrarrestrar uma exposição de uma hora de palavras de efeito junto com grotescas imágens de Holocaustos Universais que, no melhor dos casos apresentam situações  de baixíssima probabilidade.   Enquanto que a participação do John Rennie da Scientific American também me deixou uma sensação agridoce, as vezes parecia estar apoiando as malucas especulações que pretendiam passar por verdades científicas.  Talvez não mediu as palavras e se deixou levar pela excitação que produzem os holofotes.  

Eu vou resumir os cenários apocalípticos descritos no programa.
  1. Alinhamento Galático.  Sobre este tema já escrevi com muito detalhe no meu livro sobre as profecias. Aqui está o link. Sintetizando, não haverá alinhamento nenhum e mesmo que ele viesse a ocorrer, não haverá qualquer jato de energia em nossa direção. (Na versão do Discovery, o problema parece ser o contrário, o Sol eclipsará a energia vital que vem do centro galático...)
  2. Explosão solar ou Ejeção de Massa Coronal provocará um blecaute elétrico geral.  Sobre o tema também me estendi no meu livro (vide aqui). Também não acredito no tamaho do desastre, mesmo porque a atividade solar está muito mais fraca que há dez anos.  E, como diz a Holly Gilbert, "se em 2003 enfretamos todos esses problemas muito bem por que agora não?" Eu vou voltar sobre a questão num próximo blog, porque de fato é a única das especulações que conta com algum um suporte científico
  3. Ejeção de Massa Coronal dispara megaterremoto.  Também já abordamos a questão neste blog: aqui e aqui estão os links. A verdade é que alguns pesquisadores (muito poucos) acham que em periodos de maior atividade solar há um aumento, não muito expressivo da atividade telúrica terrestre.  Em outras palavras, podem acontecer mais terremotos (dois ou três a mais por ano).  Se isto for verdade (coisa que ainda não está comprovada) então já passamos por periodos muito mais perigosos, como na década de 1950 quando a atividade solar foi três a quatro vezes maior que a atual.  Devemos nos preocupar então?  
  4. Deslocamento dos Pôlos. Dos megaterremotos, Lawrence Joseph e o Discovery Channel passam a descrever uma teoria geofísica escrita por Charles Hapgood, um mestre em história medieval, que também prestou serviços na CIA norte-americana durante a Segunda Guerra Mundial, na época chamada de Office of Strategic Services.  Hapgood escreveu um livro cujo maior mérito parece ser o de ter prólogo de Einstein, depois publicou outros mais.  Na visão deste historiador a Terra poderia passar por cataclismos severos que deslocam o eixo em 30 graus ou mais produzindo uma reorganização dos continentes com graves consequências para a vida.  Ora, pesquisando nos meios científicos não achei referência nenhuma às teorias do Hapgood. Ou seja, ela é uma especulação feita por um historiador em base a interpretação de antigos mapas. Interpretação contestada até pelos próprios historiadores. Vamos voltar sobre a teoria de Hapgood num próximo post porque me lembra à de Immanuel Velikovsky sobre os mundos em colisão. (O Hapgood chegou a afirmar que há evindências de seres humanos junto com dinossauros)
  5. Inversão magnética. Também ja escrevemos bastante sobre esta questão (vide aqui).  O Ian O'Neil faz uma descrição aterradora do que poderia acontecer se o campo magnético desaparecer: o aumento da radiação ultra-violeta provocaria o aumento dos compostos em base a nitrogênio e oxigênio (chamados NOx) na atmosfera que levaria à desaparição do plancton marinho, e com ele à quebra de toda a cadeia alimentar com vastas consequências para a humanidade.  Preciso checar este cenário, mas a verdade é que se toda vez que o campo magnético inverter (e ele já inverteu centenas de vezes no passado) ocorre este colapso não se explica como não há correlação com as extinções em massa de especies. O Lawrence Joseph fala do buraco do campo magnético na região do Atlântico Sul, bem conhecida pelos brasileiros por ficar seu centro perto da ilha de Santa Catarina; e ele ainda assusta falando  de um outro buraco detectado uns anos atrás (embora passageiro).  Ora, a Anomalia existe desde muito tempo atrás (100 anos?) e nossa teconologia já contornou o problema.  Por que deveriamos nos preocupar agora?
  6. Colisão com asteroide.  Essa foi descartada rapidamente. Não existe asteroide grande o suficiente que esteja se aproximando da Terra para colidir em 2012. Disto temos certeza porque existem programas de monitoramento espacial.  Alguma pedrinha poderia até passar despercibida, mas não uma capaz de acabar com a civilização terrestre. 
Para ilustrar o programa, grostestas animações de computador mostravam ininterruptamente a devastação produzida por terremotos, tsunamis, blecautes de energia, invernos prolongados, cometas, etc, enquanto tocava no fundo uma música marcial.  No fim, com a exceção de Lawrence Joseph, de cujo convencimento sobre o Apocalípse depende o futuro de vendas de seu livro, o resto do painel foi cético quanto a possibilidade do fim do mundo.  

Mas o Discovery reservou os segundos finais para a frase de maior efeito, como relatado acima.  Na minha visão o Discovery Channel fez um papelão com este programa, desacreditou-se a si próprio, e mostrou que seu principal, senão único objetivo, é o lucro.  

lunes, 20 de febrero de 2012

Terremotos e Tempestades Solares - II

No post anterior concluimos que não era posível que a atividade solar na forma de explosões ou ejeções de massa pudesse contribuir com a ocorrência de terremotos: sendo os terremotos um fenômeno originado no interior da Terra, não vemos como as ondas electromagnéticas ou as partículas carregadas poderiam furar a rocha para chegar até a base onde as placas tectônicas repousam, e chacoalha-las.  Eu procurei tempo atrás se havia algum  aumento na frequẽncia dos terremotos e não achei qualquer tendência, como podem ver nos posts anteriores, aqui e aqui. No entanto, existem trabalhos científicos que concluem que essa interação existe.  Neste post vamos analisar alguns desses trabalhos. Ele será mais extenso que os outros e bastante mais técnico.  É necessário se   queremos entender a relevãncia dos estudos.

Na verdade são muito poucos os estudos sobre o tema, menos de 30 nos últimos 50 anos.  A maioria deles foram publicados por cientistas soviéticos (por exemplo A. D. Sytinskiy) em revistas da ex-União Soviética, em russo, alguns têm traduções ao inglês em revistas de difícil acesso.   Minha busca está lonje de ser apurada, mas não creio me equivocar quando afirmo que não é um campo muito fértil de pesquisa e que é levado adiante por poucos grupos independentes esparços no mundo e que não convenceram ainda ao resto da comunidade.

Vou comentar dois trabalhos que pude ler completos. Não vou entrar nos detalhes, mas comentar o que me interessa no contexto deste blog: os estudos têm alguma relação com as profecias maias ? 

John F. Simpson publicou em 1967 um estudo titulado Solar Activity as a triggering mechanism for earthquakes (A atividade solar como mecanismo ativador de terremotos), na revista Earth and Planetary Science Letters, volume 3 (1967), páginas 417+. Simpson usou um banco de dados de terremotos sem distinção em magnitude, entre 1950 e 1963 e comparou sua frequência diaria com o índice de Zürich (ou de manchas solares), o fluxo solar em 10,7 cm (chamado Componente solar lenta) e um índice do campo magnético terrestre llamado kp. Ele observa que passados dois anos do máximo de atividade solar há um aumento na  ocorrência de terremotos.  Procurando correlacionar estes índices descobre uma relação cúbica entre ambos sendo que a maior frequência de sismos dá-se quando o índice de manchas solares é em torno de 180 e o fluxo da componente lenta solar de 200. Aumentar os índices acima destes valores diminui a frequência de terremotos.  Embora a relação estatística parece bem demonstrada, a importância da mesma não demonstra ser chave na dinâmica dos terremotos: enquanto a média de sismos diários é de 4,6,  a atividade solar os incrementaria até 5,5. E lembremos que neste trabalho foram considerados os sismos de qualquier magnitude.  O próprio autor diz (tradução minha)

Não há dúvidas que a relação causa - efeito precisa entre atividade solar e  terremotos é que a primeira atua como mecanismo  ativador dos segundos. A distribuição geográfica e as relações tectônicas inibem qualquer dependência causal subjacente entre terremotos e atividade solar. No entanto, é inevitável concluir que o ciclo de atividade solar é significativo embora de forma alguma exclusivo na regulação temporal da liberação de energia  acumulada na crosta terrestre. 
O segundo trabalho, más recente, foi realizado por vários autores da Rússia e Bulgária: Long-period trends in global seismic and geomagnetic activity and their relation to solar activity (Tendências de longo periodo da atividade sísmica e geomagnética e sua relação com a atividade solar), por S. Odintsov, K. Boyarchuk, K. Georgieva, B. Kirov e D. Atanasov, na revista Physics and chemistry of the earth, volumen 31 (2006), página 88+.

Neste trabalho os autores usam diferentes bancos de dados. No primeiro caso é um levantamento dos terremotos na área do Mediterráneo até o século X, realizado por meio de estudos históricos e outras fontes indiretas (ou seja, não há informação da magnitude dos mesmos). Para comparar usam estimações do índice de manchas a partir do ano 300 (o índice só foi estabelecido no século XIX e podemos calculá-lo mais ou menos corretamente desde o ano 1609).  O trabalho compreende então os anos 300 até 1000 comparando o total de terremotos durante um período de 11 anos com a estimação do índice para o máximo de atividade. O resultado pode ser visto na figura abaixo.
Número de terremotos acumulados en 11 anos (linha cheia)
e índice de manchas estimado (linha tracejada).
À primeira vista pode impressionar, mas, temos que ressaltar que os autores sumaram todos os terremotos num período de 11 anos apagando qualquer variação intra cíclica.  A conclusão é que naqueles ciclos de maior intensidade durante o máximo de atividade, podem aumentar significativamente os terremotos, embora não sabemos em qual momento do ciclo. O coeficiente de correlação entre ámbas as séries é 0,47, não muito alto em termos estatísticos, embora a probabilidade de ser ao acaso é inferior a 1% (p<0.01). A relação parece, apenas, sugestiva.

Como segundo passo os autores analisam os terremotos entre 1900 e 1999 e comparam a ocorrência de sismos com o índice de manchas.  Eles encontram um aumento na quantidade de terremotos durante o mesmo ano do máximo solar, e três anos depois também.  Vejam o gráfico.

A linha cheia representa o número anual de terremotos  de magnitude maior que 7 em médias tomadas durante um ano, relativos ao momento de máxima atividade solar (año=0).  A linha tracejada é a média anual do índice de manchas.  Têm dois picos, no ano=0 (max 1) e no ano=3 (max 2).  Também à primeira vista o gráfico impressiona, mas gostaria destacar o seguinte: a média anual de terremotos é 20 com um desvio padrão S=7.  A média de terremotos durante max1 é 22,6 com S=8 e o de max2 é 21,3 com S=9.  Estatisticamente uma distribuição aleatória tem uma probabilidade de quase 70% de estar entre a média mais ou menos o desvio padrão S. Em outras palavras, a figura é sugestiva, mas estatisticamente irrelevante porque as três médias têm grande probabilidade de serem iguais.   O artigo ainda continua com outras análises, intentando mostrar a relação causal (supõem dois drivers: ejeções de massa coronal e o vento rápido solar) mas eu vou parar por aqui, porque seus argumentos não terminam de me convencer e também não quero os leitores fugindo em massa desta página.

Conclusões. Simpson encontrou um pico de frequência de  terremotos dois anos depois do máximo do ciclo solar,  já Odintsov e colegas, encontram o pico de sismos durante  o mesmo ano do máximo.  Os trabalhos são contraditórios.  A relação, tão sequer estatisticamente, está lonje de ter sido comprovada.

E a respeito das profecias de 2012?  Aceitando as conclusões de Simpson, os efeitos só se farão sentir em 2015 (dois anos depois do máximo esperado para maio de 2013). Se seguimos a Odintsov, por outro lado, a primeira correlação que eles obtêm mostra que o número de terremotos é proporcional ao índice de manchas durante o máximo: o presente ciclo solar é muito pobre em manchas, espera-se um índice  máximo um terço menor que o anterior, que já foi um terço inferior a seu predecessor.  O máximo de atividade solar dos últimos 400 anos se deu durante o ciclo cujo máximo aconteceu na década de 50.  Então, se sobrevivemos  àquela época, creio que poderemos sobreviver à atual.