miércoles, 8 de julio de 2009

Marte, a Lua e os Maias

Recebi o seguinte e-mail:


Duas Luas no Céu

O planetário Internacional de Vancouver da British Columbia, Canadá, calculou com precisão a órbita de Marte para o dia 27 de agosto de 2009. Mas o mais interessante é que os mesmos resultados estão escritos num códice maia encontrado na pirámide ao lado do Observatório Estelar em Palenque, estado de Chiapas (México). Por esse cálculo matemático agora os Maias são considerados como os gregos da América, e orgulho de México. Pelo menos quatro ou cinco gerações da humanidade não voltaremos a ver esse fenômeno natural. Muito pouca gente sabe por enquanto. Isto foi publicado na segunda feira 11 de maio de 2009:

No 27 de Agosto, a meianoite e 30 minutos, olhar o céu. O planeta Marte será a estrela mais brilhante. Será tão grande quanto a Lua cheia. Estará a 55,75 milhões de kilómetros da Terra. Será como se a Terra tivesse duas luas. A próxima vez que isto acontecer, será em 2.287.

Uma mensagem semelhante circula pela Internet há varios anos. A originalidade deste é a adição dos maias na história. Mas vejamos, o qué há de verdade? A cidade de Vancouver tem um planetário, embora não consegui achar seu site na Internet. Podemos supôr que de tanto em tanto publica notícias informando sobre as atrações que podem ser observadas a olho nú.

Como não consegui o texto que supostamente redigiu o Planetário de Vancouver, tentei conferir a exatidão das informações astronômicas.

No dia 27 de agosto de 2009, Marte estará a 244 milhões de km da Terra, e não a 55,75 milhões como diz o texto. Meu cálculo foi realizado com o programa HORIZONS criado pelos cientistas do Jet Propulsion Laboratory no California Institute of Technology. A uma tal distância, Marte será um pontinho, uma estrela de magnitude 1, brilhante, mas não chamativa. E a Lua, objeto com o que, supõe-se, igualará em brilho, terá magnitude -10, (sim, negativa†).

Fica uma pergunta aínda: pode Marte ser tão brilhante quanto a Lua em alguma circunstância? A resposta é só se uma catástrofe tirasse o planeta de sua órbita e o aproximasse da Terra. Marte, como a Lua, é um corpo opaco e seu brilho depende da reflexão da luz solar. A Lua reflete um 12% da luz que recebe, enquanto que Marte um 15% (este valor é conhecido como albedo), quer dizer que ambos são parecidos. Assim o brilho que vemos deles depende apenas da distância à Terra e do seu raio. O raio de Marte é de 3.389 km, enquanto que o da Lua é de 1.737 km, então o brilho seria igual se Marte estivesse a uma distância da Terra de uns 780.000 km, quase o dobro da distância Terra - Lua. Para conseguir fazanha tal, deveriamos mudar a órbita de Marte atraindo-o para o Sol, uns 75 milhões de km!

Por último, não temos nenhuma evidência de que esse cálculo fora, sequer, suspeito pelos maias. Simplesmente, eles são colocados no meio para dar um toque de mistério... Os maias hoje são fashion.

P.S.: Faltou dizer que duvido que um relatório tão cheio de gafes fora redigido por planetário qualquer. Me perguntou se o fato de o planetário de Vancouver não ter site na Internet não foi um motivo para que os autores da mensagem o tenham escolhido como responsável pela notícia (03.08.2009).

† A classificação de objetos celestes por magnitudes é um pouco estranha a primeira vista: quanto menor o número, maior o brilho. Coisas de astrônomo...